#14 Palmeiras e cumes brancos
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Diversidade é o que melhor define a California, parece-me.
De culturas, de paisagens, de experiências possíveis, de sabores, de fauna e flora, de abertura de espírito de quem cá vive...
Acho que se nota que tenho um crush neste lugar, e apesar de existirem aspectos com os quais nos identificamos pouco ou nada, como para já o balanço é tão positivo, espero que se nos entranhe a todos para sempre, esta disponibilidade para a diversidade.
E também o espírito "let it be".
E já agora o "all out", tanto a trabalhar como a desfrutar a vida.
Mesmo antes de chegar aqui já tinha alguma facilidade em compreender o efémero, mas na Califórnia o meu tempo é respeitado de outra forma.
Se as obrigações se aproximam de horários family prime-time (que é sagrado), há todo um esforço de compensação deste abuso.
Quero ficar feroz para sempre em relação a abusos deste tipo.
A minha produtividade tem estado em altas, mas a minha disponibilidade para a nossa equipa, e todos os possíveis programas também tem estado em altas. E tenho dormido bem. É para tirar apontamentos e replicar o mais possível.
Começamos a ter rotina de programas com amigos. Na distância dos nossos queridos amigos e da família, estes novos amigos tornam-se a nossa rede, e os nossos emergency contacts, e são mesmo uma rede maravilhosa pela qual sou muito grata.
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Falando em amigos, a família portuguesa/búlgara que conhecemos na praia, e com quem temos muito mais afinidades do que apenas a lingua, alinhou connosco num jogo dos nossos favoritos e aconteceu magia. Um dos jogadores é brasileiro e todos os "VAI SILVA!!!" foram decisivos no resultado final.
Ganhámos tudo.
O jogo (que foi renhido), prémios de todos os tipos para as crianças, e a promessa de repetir mais momentos juntos.
Na semana seguinte outro record. A Hillary (tempestade anunciada no início do ano lectivo) foi em comparação só ridícula.
O que aconteceu em quantidade de chuva no nosso spot foi épico. Parecia um chuveiro desgovernado sem parar horas a fio, com vendaval a combinar.
Tudo em casa para reduzir deslocações e o teletrabalho que me cheirou a memórias pandémicas das que fazem arrepios maus. E inundações por todo o lado.
O nosso jacuzzi e as respectivas espreguiçadeiras completamente afogadas. Record de chuva em 160 anos.
Não apreciamos a diversidade? Então tomem lá uma chuva torrencial na California que é para não serem só poéticos.
E nas horas seguintes as equipas de manutenção incansáveis puseram tudo a mexer e levaram evidentemente salvas de palmas por todo o lado. Agora é verão outra vez.
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Depois da tempestade, já se sabe...
Não estávamos por dentro do calendário da Lua, mas respondemos imediatamente que sim quando os pais do melhor amigo do Matias nos propuseram receber o ano do Dragão de Madeira com toda as tradições associadas.
Propus levar arroz doce, e o arroz simboliza tanta coisa boa que além da gulodice dos que o conheciam e apreciavam pela Ásia, foi imediatamente publicitado como A sobremesa do evento.
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Esmerei-me com arroz arborio ao preço de presunto, já não fazia arroz "à mão" (minha rica bimby!), o cheiro do leite a ferver enjoa-me e não me lembrava, mas saiu delicioso.
Orações e incenso para abençoar a comida, desejos de sorte, dar graças por uma série de privilégios, uma réplica do Chinese Gold Inglot que trouxemos para casa, e vários envelopes vermelhos e dourados com dinheiro, símbolo da fortuna para todas as crianças (17!).
Adoro comida chinesa, e tudo o que provei me pareceu delicioso.
Aprendemos uma série de tradições generosas. E agradecemos podermos partilhar este momento com uma família tão querida.
Dia seguinte de agendas desafiantes, com a nossa Mercedes Potter numa festa de anos que até magical creatures classroom teve. "Se gosto de animais não pode haver excepções, certo?" foi a resposta da Cuca perante o nosso espanto sobre o contacto tanto bicho estranho.
Os dois melhores amigos do Matias têm ascendência de Taiwan e da China. No mesmo fim de semana entrámos no ano lunar muito bem acompanhados e festejámos o SuperBowl, em casa de casal misturado entre a China e o Kansas. Confesso que o jogo em si não me cativou demasiado, mas tudo o resto foi top.
Começamos pelas apostas em cash nos quadradinhos.
Não gosto de desperdiçar nem um tostão, por isso foi com alguma resistência que apostei 2$ em 10 dos 100 quadradinhos, escrevi Pati, e tentei não pensar mais no assunto. Mais tarde, antes de começar o jogo o Rodrigo para completar apostou em mais 5 quadrados, e assim reunimos 15% de hipóteses de ganhar alguma coisa. Explicaram-me que não é preciso perceber muito do jogo, era só palpite de resultado para cada um dos 4 quarters.
Comecei a ouvir, Who's Pati???? Who's Pati?? again, Pati???
Spoiler alert, ganhei 2 dos 4 quarters, e tive de explicar várias vezes que não fazia a minima ideia do que seria um resultado lógico, nem quem eram os jogadores além do namorado da Taylor Swift, e que até achava que a alcunha dele era Chief, em vez do nome da equipa.
Foi hilariante, mas os fãs não ficaram muito convencidos.
Felizmente ganharam os Chiefs, e apesar de ser a família Luso-espanhola a arrecadar a maioria dos prémios no primeiro jogo a que assistimos na vida, os ânimos ficaram alegres, e tudo acabou em bem!
Entretanto a Maria que fez certificação de babysitter e que até já tem um rate, recebeu a proposta antes do inicio do jogo, de tomar conta dos pequenitos, e ser paga or isso. Aceitou de imediato e no fim da festa recebeu 50% mais o valor acordado (tratou deles com maestria!), e um extra para a Mercedes que a ajudou na árdua tarefa de controlar a uma troupe de ninjas enquanto os pais das criaturas assistiam ao maior evento desportivo do país.
Foi um evento divertidíssimo e altamente rentável. As manas vinham doidas, qual euromilhões inesperado!
Entretanto parece que as semanas têm sido autênticas montanhas russas, mas com o privilégio da equipa família ter tempo e espaço para andarmos constantemente em cima uns dos outros.
Passámos de uma casa cheia de espaço e conforto para um flat catita, mas apertado. Mas abrir a porta e conseguir cumprimentar toda a gente ao mesmo tempo em vez de desatar aos gritos a perguntar se alguém está em casa, penso que pode ser uma forma fofinha de encarar a redução do espaço vital. Até isso tem sido uma experiência bonita.
Entretanto a Maria queria muito contribuir para a troupe, e alinhámos na venda de cookies das GirlScouts.
Posicionámo-nos estrategicamente no meu Campus seguindo as instruções da Jenny, e tentamos estar no caminho de jovens adultos esfomeados.
No total vendemos 156 caixas de bolachinhas (6$ cada), e a Maria está com a sensação de dever cumprido na missão de recompensar tudo o que as scouts já lhe proporcionaram.
Com a mudança de turma de Matemática conseguiu também mudar para o Coro (que parece só a actividade mais cool entre os alunos de todas as idades) e esta semana foi de espetáculos de abertura de season.
Apesar de se sentir insegura ainda, para nós brilhou e distinguiu-se pelos gestos e elegância, somos suspeitos claro.
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Este ano também foi um dia de S. Valentim de facto showing love all around!
A Mercedes quis levar presentes para a turma inteira, mais a professora, mais umas amigas de outras turmas de quem gosta muito, mais os filhos da Jenny.
A Maria chegou a casa a dizer que tinha recebido doces e mensagens bonitas de amigas da escola. Sem se alterar, sem achar estranho.
Perguntei a tentar manter completa naturalidade em receber 2 "valentines" de amigas, porque achas que te deram chocolates e mensagens tão queridas essas meninas?
E ela respondeu com toda a naturalidade, porque gostam de mim!
Uma porque me pede todos os dias o meu caderno de matemática com os trabalhos de casa feitos e eu dou-lhe sem problema. A outra não sei bem, mas deve ser por alguma coisa que ela gosta que eu faça.
Eu preparei um almoço delicioso para o meu Valentine, com iguarias que me trouxe a Andreia, e foi todo um êxito! E uma das minhas alunas foi vencedora da mensagem mais original que recebi neste dia...
A Mercedes que no início do ano quando lhe apresentamos o OSS (Outdoor Science School: 4 dias de acampamento com os amigos e professores na neve) respondeu que era melhor não ir porque não tinha roupa de neve, nem amigos, nem se imaginava a estar longe de nós tanto tempo, noutra lingua e num país estranho ainda, disse-me quando na véspera estávamos a fechar a mala: "Mamã, tranquila, ok? são só 4 dias."
Mais uma vez, os amigos e comunidade da escola emprestaram-lhe de tudo para estar preparada na montanha, e lançou-se a mais esta aventura.
Sabemos que está bem e que há-de voltar mais crescida.
Levou uma máquina fotográfica descartável, e teve imensa dificuldade em compreender o porquê do número de fotografias ser finito.
Proibido levar seja o que for digital, e muito menos telemóvel.
Recebemos um email por dia a contar que tal estão.
Daqui a pouco vamos buscá-la, estamos a contar os minutos.
Esperamos que consiga aproveitar o que esta oportunidade de viver no verão com pranchas e esplanadas e palmeiras por todo o lado... e de estar a 2h do pino do inverno, com montanhas branquinhas, cabines de madeira e chocolate quente.
A diversidade é a descoberta mais interessante.
Como dizem por cá,
Have a good one!