#21 Andorinhas
As andorinhas são um bichinho simpático em todos os sentidos, e são um dos símbolos de Portugal.
Gostam de viajar, escolhem um parceiro para a vida, voltam sempre ao mesmo ninho em cada primavera, e só o abandonam quando todos os filhotes voam para sempre.
Tenho um ninho de andorinhas algures no nosso telhado na casa da Parede, e não me lembrava do prazer de acordar com a algazarra das ditas por cima do tecto.
A viagem de volta foi tranquila e assim que aterrámos em Madrid começamos logo a matar saudades. Que privilégio ter as nossas pessoas espalhadas pelo mundo e prontas para vir ao nosso encontro, distribuir abraços logo que possível.
Depois de tantas horas em que tivemos a noção clara de ter dado a volta ao mundo para ir à "terra", chegamos a Lisboa. A zona das chegadas nos aeroportos deve estar carregadinhas de endorfinas, mas quando são os nossos filhos e os nossos pais os protagonistas, é dificil controlar tanta emoção. Puxa, que sempre tive pena de não ter uma "terra" para voltar como as andorinhas, e agora sinto-me mesmo a voltar ao ninho.
O primeiro choque foi com a dimensão da autoestrada. Pareceram-me muito fofas as 3-4 faixas da A5, apesar de me parecer logo que mesmo de madrugada os condutores do meu ninho andam em treinos para altas corridas, num frenesim constante, que stress!...
Finalmente chegámos a casa, e ao abrir o portão, o cheiro da erva do caril que cresceu desgovernada e se foi misturando com a lavanda que também está mais frondosa que nunca deram-nos logo as boas vindas também. A mim, cheira-me a Guincho, e é maravilhoso.
Sei de cor as árvores, arbustos e degraus que tenho em casa. Não me lembrava das saudades que tinha dos cheiros e dos sons. Entendo agora melhor as andorinhas.
Os dias em Lisboa além de serem contados ao minuto para tratar de tudo que foi burocracias em embaixadas, trabalhar à distância, encaixar as nossas pessoas todas tipo tétris de agendas, e sincronizar calendários, foi intenso e maravilhoso em partes iguais, e a sensação boa de que a conversa fácil e o abraço parecia ter sido dado no dia anterior.
E a sensação que queríamos ter estado, e ter feito ainda mais também se apoderaram de nós. Matámos saudades de petiscos, e fiz questão de fotografar alguns para mostrar o que se come na na California da Europa aos nossos queridos amigos de Seal Beach e arredores.
E que bem que se come nesta terra. Não fotografei a pescada cozida com legumes, porque a devorei num instante e não tive tempo. E não fotografei todas as nossas pessoas queridas, que se desdobraram tanto em agendas como em Km para nos encontrarmos, mas apertei-as e cheirei-as com sofreguidão de andorinha.
Os momentos altos da nossa estadia, claro está, são os encontros, e as surpresas de reencontros.
Os únicos momentos duros, as despedidas.
Portugal é de facto um cantinho carregado de maravilhas.
Tem uma concentração de pessoas incríveis a quem temos o privilégio de chamar família e amigos, recantos encantadores, e petiscos delícia.
O Rodrigo esteve envolvido há uns anos num projecto que adorei, e que resume bem o encanto do nosso ninho. Fica registado aqui para aguçar o apetite aos amigos deste lado do planeta, quando pensarem em vir visitar-nos.
Isto é Cascais, onde fica a nossa casa na Parede, que é como quem diz, o nosso Seal Beach tuga.
Com vistos e afins tratados, de coração cheio, baterias recarregadas e malas feitas, regressámos a Seal Beach cheios de vontade e já cheios de saudades.
Será que os bichos que migram também sofrem disto? Porque é tão bom e tão mau ao mesmo tempo...
Aterrámos e fomos tão bem recebidos...
Que diferença, o aterrar de há um ano atrás e deste ano, com uma rede de luxo para nos apoiar em todas as logísticas. Chegámos no conforto deste abraço, com uma selecção de groceries para podermos descansar sem a preocupação de encher o frigorífico e a barriga. Obrigada mais uma vez à família Berg...
Logo de seguida fomos buscar a nossa mais que tudo patuda, que esteve de férias em casa dos avós da Amina, a amiga especial da Maria. Obrigada Pamela, por mais esta logística facilitada...
Ficou doida quando nos reencontrou, e já estava dentro do carro quando percebeu que nos íamos embora. Saíu do carro a correr de volta para dentro do jardim dos queridos avós da Amina, encostou-se a um, depois a outro, e correu de novo para nós.
Como é obvio, achamos sempre que os nossos são os mais incríveis, mas esta Mel tem uma sensibilidade fora de série, e ficámos todos pasmados com a cena bonita de agradecer/despedir destas pessoas que nos aliviaram o stress de a ter do outro lado do mundo, e que a cuidaram tão bem.
Voltámos a casa e devagarinho reorganizámos a rotina, preparámos o regresso às aulas, e a mudança das 3 escolas.
Como a Maria durante o verão em Lisboa, e com o apoio do avô Zé e os mimos da avó São, acabou o curso de Àlgebra a que se propôs com 97%, tive de cumprir a promessa. Recompensámos as manas com um programa altamente apetitoso por estas bandas, e fomos passar a tarde a Pasadena para assistir à semi-final do show que ela mais adora, com uma das actrizes que todos mais adoramos.
America's Got Talent, e uma tarde de miúdas muito bem passada.
Dia seguinte arranca para as 3 escolas! Organização impecável, e eventos em cada uma das 3 escolas para conhecerem todos os professores e cantos à casa, intenso mas em bom iniciámos o ano lectivo com um sentimento de nervoso muito diferente de há um ano atrás.
O Matias, feliz em ir para a escola dos crescidos e estar na mesma turma do seu Kingston.
A Mercedes de quem recebemos um email do melhor Principal do planeta com uma selfie dele com a Mercedes.
A Maria chegou a casa cheia de planos de jogos, festas, danças e afins. A highschool parece muito animada.
Fim de semana de festa de aniversário da Annie, que fez 8 anos na praia, e onde fui encontrar o Matias em amena cavaqueira. O Matias tem um crush em avós, e na distancia dos seus, adoptou os dos amigos!
Também recolhemos os diplomas de Baywatch das manas. California style é um style muito jeitoso.
No caminho para casa de bicicleta a Mercedes disse que se sentia estranha, porque "parecia que estavamos em Portugal. Mas só que não era Portugal, mas parecia que era porque gostava do sítio, das pessoas, e da casa. E até se sentia bem! Mas que não era casa! Ou era?!"
Pffffff que confusão de sentimentos...
No meio da semana achei que me ia enfiar num aviãozito para chegar ao Rio de Janeiro, e como a Geografia nunca foi o meu forte achei que era a brincar mais 2 voos de longo curso. Só que não era, e lá fui eu para Sul para um Congresso de Fisioterapia em Obstetrícia.
Adorei tudo.
A cidade é deslumbrante, e acompanhada de locais o passeio é muito mais tranquilo.
O Congresso em si foi interessantíssimo, os trabalhos apresentados muito consistentes e interessantes, e os planos que fomos fazendo entre colegas prometem. Espero conseguir corresponder e crescer com eles.
O carinho e a forma como os brasileiros recebem é exímia, e voltei abrumada com tão boa energia que ali vivi. O único senão foi no regresso em que devo ter comido algo que me fez mal, e cheguei literalmente de gatas. Eu a achar que ia drogar-me e dormir, e afinal passei os voos todos em claro, com suores frios e uma gastroenterite do tamanho das casas.
A Mel, claro está, feliz de ter a sua doninha de volta, e os restantes membros da troupe, apesar de não me comerem a beijos desta maneira, também me pareceram muito contentes.
Depois de gerir viroses e afins percebemos que o fim‑de‑semana prolongado podia ser bem aproveitado, o Rodrigo reservou umas noites num "sítio fixe" e ala para Lake Tahoe.
Há anos que estava na minha bucket list, mas nunca pensei que fosse tão impressionante.
A paisagem de lago, água cristalina, e pinheiros com montanhas é para nós exótica. Mas o aroma a pinhal, os trilhos, os caminhos de bicicleta bem cuidados, os kayaks, os restaurantes e os bares, a vida selvagem, o ambiente em geral tem uma mistura de charme de estancia de sky, com a boa onda de praia e desportos aquáticos. Tudo family friendly.
Na nossa modesta opinião, é o sítio mais imperdível de toda a California.
Adorámos.
Fizemos tudo o que pudemos para viver esta natureza quase em bruto da melhor maneira possível, e ainda estamos de ressaca...
A Mel finalmente aprendeu a nadar, e em água sem ondas e que dá para beber é aparenemente mais user friendly. Depois do esforço, banhos de sol, mas sem se sujar de areias, que isso é que está fora de questão.
No final do último dia, depois de esperarmos pelo Rodrigo que foi buscar o carro mais longe do que o trilho que fizemos, sentadinhos no murete que se vê no video, o Rodrigo chegou, carregamos o carro, e reparámos que toda a gente em frente a nós no parque de estacionamento, estava de olhos esbugalhados a olhar na nossa direcção, e eu vejo no reflexo do espelho um bicho enorme, dou um grito, e já só consegui impedir que as crianças fossem a correr atrás do pai, que tem tanto de talentoso, como de louco perdido, com um histérico, "ninguém sai do carro!!!"
O que se faz quando encontramos 1,2,3 ursos? Corremos para eles, a parar o trânsito da 89, para que passem em segurança, obviamente! Adoro a parte do Rodrigo se dirigir aos babies em inglês, para compreenderem cumprirem ordeiramente o que se lhes sugere.
Graças a Deus que o Universo nos protegeu e este foi só mais um momento mágico, deste lado do mundo que gostamos tanto.
Há dias percebi que o nosso querido Salvador Sobral vai mudar de casa, de país, de pouso.
Esta canção dos GNR diz tudo.
As asas servem pra voar.
Pra sonhar, ou pra planar
Visitar, espreitar, espiar...
Mil casas do ar...
Está tudo certo Mercedes. A casa somos nós.
Adoro andorinhas.